Descrição do livro:
Muito mais que “esboços” ou adiantamento da obra maior de Karl Marx, os três manuscritos econômicos de
1857-1858 que compõem os quase lendários Grundrisse constituem patrimônio das ciências humanas de
inestimável valor.
Parte de uma luta ideológico-política pela exclusividade do “verdadeiro” Marx, a obra somente veio à luz já na
primeira metade do século XX, em virtude dos conflitos centrados no controle que o Partido Comunista da exURSS exerceu sobre os escritos não divulgados do filósofo alemão. Considerados inicialmente espécie de
amostra ou work in progress do que viria a ser a obra central de Marx, sabe-se hoje que examinar os Grundrisse
é como ter acesso ao laboratório de estudos de Marx no curso de sua extensa atividade intelectual, o que
permite acompanhar a evolução de seu pensamento, as áreas específicas de interesse que deles se
desdobram, e, sobretudo, compreender no detalhe o seu método de trabalho.
Publicada integralmente e pela primeira vez em português, esta obra crucial de Marx para o desenvolvimento
de sua crítica da economia política consiste em três textos bastante distintos entre si em natureza e dimensão.
O primeiro, que só mais tarde o filósofo intitularia “Bastiat e Carey”, foi escrito em um caderno datado de julho
de 1857. O segundo, contendo o que seria uma projetada Introdução à sua obra de crítica à economia política,
é de um caderno de cerca de trinta páginas, marcado com a letra M e redigido, ao que tudo indica, nos últimos
dez dias de agosto de 1857. O terceiro manuscrito, e o mais extenso, compreende a obra póstuma de Marx que
ficou conhecida como Esboços da crítica da economia política, ou simplesmente Grundrisse, conforme o título
da edição alemã. Tal texto consiste em dois capítulos (“Capítulo do dinheiro” e “Capítulo do capital”)
distribuídos em sete cadernos numerados de I a VII. Segundo Francisco de Oliveira, professor de sociologia da
Universidade de São Paulo (USP), na capa do livro, “o vigoroso teórico pode ser justamente tido como um
escritor de primeira plana; ele tinha, sem muita modéstia, inteira consciência de seu valor literário e, talvez por
exagero – e que temperamento! –, tenha deixado na obscuridade muitos textos dos Grundrisse e que estão
agora com os leitores do Brasil e de outras paragens para nossa delícia teórica e nossas elaborações na
tradição marxista”.
Trabalho de anos de tradução rigorosa diretamente dos originais em alemão, com coedição da Boitempo
Editorial e Editoria UFRJ, os Grundrisseconstituem a versão inicial da crítica da economia política, planejada
por Marx desde a juventude e escrita entre outubro de 1857 e maio de 1858. Ela seria depois muitas vezes
reelaborada, até dar origem aos três tomos de O capital. “O fato de ser uma primeira versão não faz destes
escritos algo simples ou de mero interesse histórico. Além de entender o ponto de partida da grande obra de
maturidade de Marx, eles permitem vê-la de uma perspectiva especial só possível com manuscritos desse tipo,
pois, como não pretendia ainda publicá-los, o autor os considerava uma etapa de seu próprio esclarecimento,
concedendo-se liberdades formais abolidas nas versões posteriores”, afirma na orelha o professor de história
da USP, Jorge Grespan.
Segundo o tradutor e supervisor da edição, Mário Duayer, mesmo diante de mazelas da vida, o prognóstico de
uma crise econômica iminente forneceu a Marx o estímulo para pôr no papel as descobertas de seus longos
anos de estudos de economia política e dar uma primeira forma à sua crítica. “Vivendo em extrema pobreza,
permanentemente sitiado por credores, cliente habitual de lojas de penhor, castigado por problemas de saúde e
devastado pela morte prematura de quatro dos seus sete filhos – decerto em virtude das condições materiais
em que vivia a família –, o que de fato surpreende é como ele foi capaz de produzir, nessas circunstâncias, não
só um trabalho tão magnífico, uma das obras científicas mais importantes e influentes de todas as épocas,
mas, acima de tudo, uma obra motivada por uma paixão genuína pelo ser humano”.